Quando transformar uma mão em blefe? A estreia de Haxton no "Punt of the Day"

No episódio de hoje do Punt of the Day, temos a estreia de um dos meus adversários mais antigos – Isaac Haxton. Jogamos uma quantidade enorme de mãos um contra o outro, mas, ao contrário do que acontece com Mike Watson, a maioria delas foram potes com limp pré-flop, jogados em blinds, com checks pensados em todas as streets e quase nenhum investimento no pós-flop. Hoje, vamos focar em uma mão mais interessante, que aconteceu em novembro de 2021, em um torneio de $5.000 no GGPoker.

Haxton já era uma figura relevante nos torneios ao vivo desde aquele blefe memorável no heads-up do PokerStars Caribbean Adventure em 2007. Ele acumulou grandes ganhos em cash games, tanto ao vivo quanto online. É excelente no no-limit hold'em, pot-limit omaha e short deck. Ocupa o 8º lugar no ranking de maiores prêmios da história do poker. E houve um tempo em que ele também brilhava nos mixed games. Em resumo, por qualquer métrica possível, Isaac Haxton está entre os melhores jogadores da história do poker.

Quando ele avançou bastante no Main Event da World Series este ano, também participou da coleta de mãos-candidatas para o meu blog, me enviando a seguinte mensagem direto da mesa:

“Caramba, temos aqui um verdadeiro Punt of the Day, assistam na transmissão em meia hora!”

Quando publiquei esse print no Twitter, dois comentários me chamaram bastante a atenção.

Niall Farrell escreveu: “O fato de que alguém como o Ike pode mandar uma mensagem dessas num grupo me alegra de forma inexplicável.”

Outro usuário comentou: “Uau! Então esse cara é um ser humano também??”

Essas reações me surpreenderam. Lembrei delas de novo ao ler o primeiro post brilhante de Stephen Chidwick no Twitter e ao ouvir os comentários da coletiva de imprensa do golfista Scottie Scheffler antes do British Open (vale a pena conferir a excelente análise das falas dele feita por Justin Borne).

Há muito tempo, no início do primeiro boom do poker, os jogadores eram retratados de forma bem diferente. Phil Hellmuth era o “Poker Brat”, Doyle Brunson era o cowboy texano da velha guarda, Howard Lederer era o “Professor”, Patrik Antonius era o escandinavo imperturbável, e assim por diante. Quase todos os jogadores da minha geração foram rotulados como "magos" (termo inventado por Antonio “The Magician” Esfandiari). Infelizmente, meu vocabulário não é bom o suficiente para entender por que “mágico” soa como alguém descolado e carismático, enquanto “mago” parece um nerd sem graça.

Depois que os solvers invadiram o poker, o termo “mago” deixou de ser usado. Agora os jogadores são chamados de “solvers humanos” ou “calculadoras ambulantes”. Nada muito novo – foi exatamente assim que a equipe da ESPN reagiu ao saber que Chris Ferguson e Annie Duke tinham doutorado. Mas qual o sentido de retratar todos os jogadores como algoritmos vivos? Não dá pra dar o mesmo apelido para todos os lutadores de wrestling! Cada um precisa ter seu diferencial.

O que me espantou nas reações ao meu tweet sobre o Ike e ao post do Chidwick? O número de pessoas que acreditam seriamente que os melhores do mundo em um jogo que exige profunda leitura da natureza humana são desprovidos de qualquer emoção. Tive a sorte de conhecer muitos deles pessoalmente, longe das mesas. E não quero ofender meus leitores, mas se você também acha que os regs de super high rollers, mesmo sendo altamente teóricos, são robôs sem sentimentos que nunca soltam um palavrão contando uma história engraçada para um amigo… talvez valha a pena se esforçar mais para entender os seres humanos à sua volta. Um pouco de curiosidade nunca fez mal a ninguém – nem no poker, nem na vida.

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Agora, vamos à mão:

22 de novembro de 2021 – GG Poker Sunday Blade
Buy-in: $5.250 – Garantido: $300.000
Blinds: 80/160 – Ante: 20

Pré-flop:
Eu (stack de 6.239) dou raise para 384 do hijack com . Isaac Haxton (stack de 9.344) dá 3-bet para 1.038 do botão.
Todos foldam até mim e eu dou call.

Flop (2.456):
Eu dou check. Haxton aposta 672. Dou call.

Turn (3.800):
Dou check. Haxton dá check atrás.

River (3.800):
Dou check. Haxton dá check de novo e vence com .

O que eu estava pensando?

A decisão no pré-flop me pareceu marginal, mas jogando do hijack contra um botão que aplicou um 3-bet de apenas 2,7x, achei que o call era adequado.

No flop, a sensação foi parecida com a do pré-flop: tenho um par fraco e um gutshot não muito empolgante, estou dominado com frequência, mas minha equidade contra esse tamanho de aposta ainda é grande demais para foldar.

No river, achei que ao dar check eu ainda poderia vencer alguns blefes do pré-flop que o Ike teria desistido de continuar. E, para blefar, o ideal seria ter uma carta de espadas na mão.

Onde eu errei?

Pré-flop – É um call quase neutro. O 4-bet sem ser all-in é uma resposta bastante comum, mas sua expectativa é próxima de zero. Tecnicamente, o fold não é a melhor jogada, mas pode se tornar, se você, como qualquer ser humano, comete erros no pós-flop (falarei mais sobre isso a seguir).

No flop, eu poderia ter foldado contra um size maior, mas um quarto do pote é muito pouco para me forçar a largar uma mão que, embora não impressione à primeira vista, é forte o suficiente para continuar.

No turn, meu range tem grande vantagem! Eu tenho straight ou flush em 47% das vezes. Ike raramente dá 3-bet com mãos suited do botão nessa profundidade de stack, enquanto quase todo o meu range de call na 3-bet dele é composto por mãos suited. As offsuit e pares menores nesse bordo, com as quais dei call pré-flop, geralmente foldam no flop. Restam e , que são straights.

Eu posso liderar o turn com dois tamanhos:

– Uma blocking bet que força folds de alguns top pairs sem redraw e de .

– E um size de 50% do pote, que pode fazer mãos fortes foldarem, como dois pares, e .

Se devo ou não blefar no river com sem uma espada depende de com que frequência eu lidero o turn. Se sigo uma estratégia com leads, no river meu range tem cerca de 49% de equidade, e ATo sem espada mistura entre check e bet.

Se eu sempre dou check no turn, segundo o GTO, o Ike deve dar check back com todas as mãos. Nesse caso, eu tenho 54% de equidade no river, e ATo sem espada ainda joga com estratégia mista.

Na prática, no entanto, é quase certo que eu não lidero o turn com a frequência que o solver faria, e o Ike provavelmente apostaria um segundo barrel contra o meu range forte com frequência maior que 0%. Nesse caso, após dois checks, a vantagem do meu range no river sobe para 56–57%, e se torna praticamente um blefe obrigatório.

Algumas combinações de ATo sem espada sempre dão check, outras sempre blefam – e eu não entendi o critério. Com a minha combinação específica, o blefe é obrigatório, embora não traga valor esperado (EV) adicional.

Tipo de erro

– Medo de aplicar uma linha incomum no turn

– Covardia no river

Avaliação

Muitas das mãos que compartilho no POTD giram em torno do mesmo tema: eu tento fazer algo criativo, mas acabo levando a pior.

No exemplo de hoje, meu principal erro foi a falta de confiança para seguir uma linha criativa contra um dos melhores jogadores do mundo.

No entanto, no river eu estava quase certo de que deveria blefar, porque as pessoas não fazem slowplay com a mesma frequência que um solver, e com certeza não apostam mãos do meio do range, como , com a frequência que o solver indica.

Foi um spot complicado contra um oponente difícil, em que eu não estive à altura.

Por outro lado, esse erro me custou relativamente pouco.

Nota: B-

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