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DavyJones é um dos jogadores mais temidos dos high stakes. Ele joga bem contra regulares, mas também encontra um approach especial contra os recreativos. E tudo isso porque ele é incrivelmente bom em fazer algumas coisas muito importantes — e agora vou contar exatamente quais.

Se você joga limites altos, é claro que precisa conhecer GTO. Mas para ter winrates de 7-8 BB por 100 mãos em fields super-elitizados, é preciso mais — a habilidade de adaptar o jogo em tempo real. Às vezes, por exemplo, é necessário jogar mais tight do que o GTO sugere — e começamos com esse tipo de exemplo.

Davy abriu do cutoff com A8o e recebeu o call de Chris Nguyen no big blind. No flop, ele fez uma c-bet alta, de 75% do pote:

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O solver aprova tudo: é o jogo ideal tanto para o range inteiro de Davy quanto para essa mão específica.

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Chris deu call, e no turn, , jogaram de check-check. Aqui Davy se desviou levemente do GTO — com qualquer , o solver faz um segundo barril, e com um size grande. No river, , Chris de repente aplicou uma overbet: $7.400 num pote de $4.900.

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Do ponto de vista do solver, Davy tem uma mão dentro do top 10% do range, então é um snap-call com +4 BB de EV. Nosso herói, é claro, sabe que teoricamente deve pagar — mas na vida real, ele não se apressou. Pensou bastante. Vamos discutir o porquê.

Para que o call seja lucrativo, ao menos uma das duas condições precisa ser satisfeita:

  • Chris precisa ter blefes suficientes no range.
  • Podem haver value bets que o vence.

O segundo ponto já apresenta dificuldades: o solver às vezes faz uma overbet aqui com , mas as pessoas não costumam fazer isso (e além disso, essas mãos dividem com , não ganham). Então, vamos discutir os blefes. E aqui precisamos fazer duas perguntas:

  1. Quantas mãos de blefe há originalmente no range de Chris (desde o pré-flop)?
  2. Quais dessas mãos chegaram até o river?

À primeira vista, parece haver muitas candidatas a blefe — uma infinidade de flush draws e straight draws inacabados. Mas vamos analisar passo a passo:

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De um lado, o range de defesa do big blind é bem amplo — e muitas mãos podem ser usadas como blefe no river. Mas não podemos esquecer que ele pagou uma c-bet de 75% do pote no flop — e dificilmente faria isso com apenas duas overcards. Podemos eliminar essas.

Agora algo ainda mais importante: se estamos falando de um oponente minimamente agressivo, ele precisa ter um range de check-raise no flop. E são justamente para o check-raise que vão muitas das mãos que tentaríamos atribuir a blefes no river: por exemplo, flush draws com gutshot.

Vamos brincar um pouco com o solver. Do ponto de vista do GTO, Chris deveria dar check-raise nesse flop em 8,52% das vezes. Não é tão frequente — e isso porque mesmo combo draws o solver nem sempre quer check-raisar. Mas os humanos tendem a jogar essas mãos de forma mais agressiva. E é aqui que vou fazer alguns ajustes:

  • Combo draws vão dar raise no flop com mais frequência: 75% das vezes em vez de 24,5%.
  • Flush draws com A-high vão dar raise no flop em 40% das vezes em vez de 11%.
  • No river, Chris vai aplicar overbet com blefes com menos frequência: 16% em vez de 32%.
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Atenção: não estou mexendo em mais nada, embora pudesse ajustar muito mais. Por exemplo, aumentar a frequência de check-raise no flop com straight draws de duas pontas, gutshots, pares baixos. Também poderia adicionar mais mãos de valor no overbet do river, incluindo trips — provavelmente seria justo. Mas para o experimento, isso já é suficiente: quero mostrar como tudo muda drasticamente com pequenos ajustes nas frequências.

Refazemos os cálculos e observamos. Voilà: o call com A8o passa a ser praticamente break-even, e com blockers específicos, torna-se até -EV.

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Assim, um call super óbvio segundo o GTO se torna totalmente dispensável se você trouxer a estratégia "ideal" para o mundo real. Davy entende isso, por isso ficou pensando se deveria foldar. Mas, no fim, ele não conseguiu resistir:

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Agora vamos ver o outro lado. Às vezes, ao explorar o adversário, é possível jogar mais loose do que o GTO recomenda. E quem vai nos mostrar como isso funciona é novamente DavyJones — e com a mesma mão, inclusive. Vamos olhar rapidamente como ele bolou um calldown corajoso contra Linus Loeliger, que o solver considera estritamente -EV.

Raise do botão, Davy pagou no big blind, c-bet no flop:

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Call. No turn, , Linus aplicou uma overbet de $1.200 num pote de $830, e Davy mais uma vez não desistiu. No river, surgiu o dilema:

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Vamos voltar à lógica do exemplo anterior: quantos blefes há no range do Linus como um todo, e quantos desses chegaram ao river? A resposta é simples — todos! O range de raise do botão é muito amplo, e na linha “c-bet pequena – overbet – overbet” podem estar praticamente todos os blefes possíveis. Davy sabe disso:

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E por fim, a melhor forma de exploração: se adaptar a um recreativo.

Davy abre com , recebe call de um VIP no small blind e de um regular no big blind. Acerta trips, aposta — e toma um check-raise:

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O big blind folda, Davy dá call. No turn vem uma bomba:

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Call. No river, . O oponente dá check. Ele tem $47.000 para trás, o pote tem mais de $71.000. A única opção seria um all-in, certo? Nenhum outro size parece fazer sentido...

Mas isso só na teoria. Na prática, estamos jogando contra um recreativo, o GTO aqui não serve, e equilíbrio não importa. Ou seja, não precisamos do size “correto” — e sim daquele que vai extrair o máximo de lucro agora, contra este oponente específico.

O que o recreativo estava representando com o check-raise no flop? Provavelmente uma dama. No turn, ele continuou a história usando o size mais polarizado possível. Se ele tivesse acertado um rei, dificilmente teria usado o size de pote. Então podemos presumir com bastante segurança que ele tem ou uma dama, ou algum draw que bateu, ou absolutamente nada.

Agora, sobre o check no river: quase sempre (sempre?) um recreativo que tem uma dama vai simplesmente shovar, sem inventar nada. Ou seja, provavelmente ele não tem uma dama — e também não tem um rei, como dissemos acima. E justamente dessas mãos que esperaríamos um call, caso fôssemos all-in! E o que sobra? Algumas mãos bem fracas ou absolutamente nada— será que dá pra extrair algo delas no river?..

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Olhem para essa aposta — é genial. Só assim dá pra tirar valor de uma mão aleatória fraca, como um pocket pequeno ou um -5- que acertou no river. E mais: ainda deixamos a porta aberta para que o oponente invente um check-shove de blefe, se a ideia passar pela cabeça dele. É raro, mas o risco existe.

Esse tipo de value bet você nunca vai ver no mundo do GTO. Mas vivemos no mundo real — e poucas pessoas entendem isso tão bem quanto DavyJones.

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