Leo Margets sobre a mesa final da WSOP: "Limite o uso do celular e não tenha arrependimentos"

Maria Konnikova e Nate Silver conversam com a primeira mulher em 30 anos a chegar à mesa final do Main Event da WSOP. Eles exploram seu estado mental durante a deep run, seus métodos para relaxar e os fatores que a ajudaram.

Maria Konnikova: Bem-vinda ao programa, Leo. Estamos muito felizes em ter você aqui.

Leo Margets: Obrigada, Maria. Obrigada.

Maria: Leo, acho que te conheci quando comecei a jogar poker há uns seis anos, mas você já jogava há muito tempo. Lembro de pensar: “Uau, ela já conquistou tanto.” Pode começar contando o que este ano significa para você na sua carreira de poker? Você já está nessa há mais de uma década.

Leo: Dezessete anos, na verdade. Sim, sou um dinossauro. Este foi o meu 17º Main Event.

Maria: Então, Nate e eu juntos jogamos juntos menos Main Events do que você sozinha.

Leo: Quando digo 17 Main Events, parece surreal. Não me conecto com o número porque não tenho nenhum burnout com o poker. Ainda amo o jogo, e esse amor me mantém motivada.

Maria: Como você manteve o foco no Main Event sem deixar as distrações externas te afetarem? O Main é uma maratona se você vai fundo.

Leo: É definitivamente um jogo de energia. Desde 2018, monitoro meu desempenho em séries longas numa planilha Excel. No fim de cada dia, me dou notas em categorias como objetivos, foco e técnica. Isso me ajuda a manter o rumo.

É como ir à academia. Se no primeiro dia você agacha com 100 kg e faz 10 repetições, no oitavo dia sem descanso não vai repetir o mesmo desempenho. No físico vemos isso, mas mentalmente é mais difícil notar sem anotar. No 11º dia de uma série, você pode achar que está dando 100%, mas na verdade pode ser só 60% do seu “verdadeiro” 100%.

Quando vejo notas caindo, tiro um dia de folga. A melhora no dia seguinte é enorme. Também escrevo meus objetivos como se fosse minha “Leo ideal” e pergunto o que ela faria. Descobri que preciso me divertir na mesa para jogar meu melhor.

Além disso, foco em validar minhas próprias decisões. Se consigo explicar para mim mesma por que fiz algo, não me importo com o julgamento externo. As pessoas sempre vão julgar. Essa mentalidade me deixou jogar sem expectativas, sem medo de ser eliminada e sem ansiedade de ganhar. Foquei apenas em jogar cada mão da melhor forma e curtir o processo.

Estou orgulhosa porque fui a versão de mim que queria ser numa situação como essa. Claro que senti um frio na barriga, até na mesa final, mas era do tipo que eu queria. Eu estava onde queria estar. Foi uma ótima experiência.

Nate Silver: Uma coisa que percebi — e nunca fui tão deep quanto você — é que no dia cinco ou seis, os nervos aumentam. Para muitos, chega um momento em que se está jogando por mais dinheiro do que nunca. Como você lidou com isso? E sua deep run em 2009 ajudou?

Leo: No meu primeiro Main Event fui deep, e aprendi o que não fazer. Na época, usei muito o celular e absorvi demais cada comentário e dose de dopamina das mensagens. Desta vez, depois do dia seis, parei de abrir o Instagram e limitei o uso do celular apenas para atualizar quem eu queria — como meus pais: “Estou viva, indo bem, não se preocupem.”

Não senti a pressão externa que muitos imaginavam, mesmo sendo tanto tempo desde que uma mulher chegara à mesa final. Eu só queria dar meu melhor.

O verdadeiro desafio foi que, ao chegar à mesa final, todos comemoraram como se estivesse encerrado. Eu também estava feliz, mas sabia que era só o começo e que tinha uma chance incrível de fazer ainda mais.

Na véspera da mesa final, conversei com Adrian Mateos e Steph. Adrian disse: “Você sabe que pode ganhar, certo? E também que pode cair na primeira mão.” Isso não me abalou. Pensei: “Sim, vou jogar, dar meu melhor.”

Saí satisfeita, sem arrependimentos sobre meu jogo ou sobre como lidei com o momento. Estava pronta para errar, se fosse o caso. Mesmo que a pressão causasse um erro, aceitaria desde que tivesse dado meu melhor.

Sou muito grata por ter vivido isso com meus amigos próximos, minha equipe e a comunidade do poker. Depois percebi quantas pessoas estavam torcendo por mim. É uma sensação única. A mãe do Michael veio até mim a caminho da mesa final e disse: “Meu coração está dividido porque meu filho também está lá, mas quero muito que você vá bem.” Momentos assim são especiais.

Maria: Algo que você disse antes realmente se destaca, e acho que vale destacar para todos, incluindo nossos ouvintes. Assistindo você na mesa final, você estava obviamente focada, mas também estava se divertindo muito. Essa energia era visível, e acho que é um lembrete muito importante. O poker é uma forma fenomenal de aprender a pensar melhor e se desenvolver como pessoa, mas ainda é um jogo. É para ser divertido. Eu gosto de pensar que parte do seu desempenho excepcional veio de realmente estar se divertindo.

Leo: Sim. Não posso falar por todos, mas para mim, o poker também é uma ferramenta para me conhecer melhor. Depois de 17 anos jogando seriamente, percebi que dou o meu melhor quando estou me divertindo. Somos sortudos por poder dedicar nosso tempo, energia e esforço a um jogo. Jogos existem para serem aproveitados. É a mesma coisa quando treino na academia — eu me divirto, e é por isso que continuo. Com o poker, este ano foi diferente. Acho que nunca me diverti tanto. De aproximadamente 90 horas de jogo, talvez só duas horas, eu não tenha aproveitado.

Nesses momentos, percebi que estava apressando decisões. Lembro de uma mão contra o Michael em que dei um snap fold só para evitar o desconforto. Mas o poker é cheio de situações desconfortáveis, especialmente no mais alto nível. Nos primeiros dias da série, eu estava tão focada que realmente queria enfrentar essas situações. Elas fazem parte do jogo. Se você tenta evitá-las, não consegue ter o seu melhor desempenho. Não dá para escolher só os spots fáceis. Lembrei a mim mesma de abraçar o desconforto. Fiquei curiosa e até ansiosa para enfrentá-lo, sabendo que isso me tornaria uma jogadora melhor.

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Maria: Eu amo que você esteja destacando a importância de tirar o tempo necessário. Eu também luto com isso. Sou uma jogadora rápida e não gosto de tankar. Chego a pedir o relógio para as pessoas. Mas, às vezes, cometi grandes erros porque agi rápido demais. É fácil dar um snap fold ou um snap call sem garantir que você considerou tudo. No poker e na vida, muitas vezes agimos sem dar aquele momento extra para pensar. Fico feliz que você tenha falado sobre isso.

Leo: Sim, esse era um dos meus leaks, e uma das áreas nas quais me avalio todos os dias. Sei que alguns dos meus erros vieram de jogar rápido demais. Eu acredito que penso bem, e claro que sempre há espaço para melhorar, mas, se eu cometer um erro, quero que seja porque existe algo que eu não sabia — e não porque não me dei tempo suficiente para chegar à decisão certa. Às vezes, tudo que é preciso são mais alguns minutos.

Nate: Essa diferença entre a “Leo ideal” e a real é algo com que todo jogador pode se identificar. Todos nós já tivemos mãos em que, no momento, pensamos: “Se eu fosse um jogador realmente bom, eu foldaria aqui” ou “Eu transformaria essa mão em blefe.” Mas estamos cansados, não nos esforçamos, e deixamos o spot passar. Você tinha um stack grande no início do Main ou quando começou a achar que poderia chegar à mesa final?

Leo: Nunca. Eu estava apenas focada em cada mão. Essa é a beleza disso — eu não tinha expectativas. O objetivo era simplesmente jogar o meu melhor. É por isso que estou orgulhosa. Não passei o torneio pensando: “Vou chegar à mesa final.” E, de repente, lá estava eu.

Maria: Obviamente, as pessoas vão falar disso como um momento histórico — a primeira vez em 30 anos, a primeira na era moderna. E, embora a run da Barbara Enright tenha sido incrível, passar por 200 jogadores é muito diferente de passar por 10.000. Agora que acabou, isso parece algo grande para você? Vai mudar a forma como você encara sua carreira, ou é apenas mais um torneio em que você foi longe antes de seguir para o próximo?

Leo: É seguir para o próximo, mas estou aproveitando a experiência. Todos nós sonhamos com isso, e eu estava vivendo, então quis saborear. Mas não sinto que represento todas as mulheres no poker. Fico feliz se alguém — mulher, homem, quem quer que seja — se sentir inspirado pelo que fiz, mas cada pessoa representa a si mesma. Sinto-me honrada se minha run inspirar alguém, mas não diria que falo por todos.

Quanto a como isso muda as coisas, honestamente, sinto-me menos motivada para jogar eventos de buy-in baixo como $1K. Mas, além disso, não vou de repente sair perseguindo super high rollers ou tirar um ano de folga. Vou continuar grindando como sempre fiz. Sou sortuda por amar o jogo e amar trabalhar para melhorar.

Estou muito bem cercada, e acho que é fundamental poder discutir mãos e realmente pensar poker. Mas não, tenho sorte de isso não mudar muito para mim.

Nate: Aliás, há um dia de pausa antes da mesa final, certo? Como você passou esse tempo? Estava se preparando, conversando com amigos, dormindo ou apenas relaxando na piscina?

Leo: Tratei como mais um dia do Main Event — só sem cartas. Minha abordagem foi: este não é um dia de folga, é um dia de Main Event, apenas não estamos jogando. Mantive minha rotina. E, acredite ou não, o dia em que dormi melhor em toda Vegas foi o dia antes da mesa final. Dormi nove horas.

Nate: Isso é inacreditável.

Leo: Eu também não acreditei, mas mostra o quão relaxada e feliz eu estava por estar ali. Isso também me deu confiança, sabendo que estava bem descansada. Mantive tudo muito calmo — treinei de manhã, almocei, evitei socializar demais. Sou um pouco introvertida, então precisava de um tempo para mim. Tive uma reunião com Adrian Mateos e Steph por algumas horas, depois jantei sozinha às 20h e estava na cama às 21h30.

Nate: A Maria e eu, na verdade, queríamos você no programa mais do que o homem que ganhou o Main Event, Michael Mizrachi. Se ele quiser participar depois, tudo bem, mas como foi jogar contra ele?

Leo: Gostei da energia dele. É tão desconfortável de ter na mesa — e digo isso como o maior dos elogios. Em certos momentos, percebi que ele estava me atacando — sendo extra agressivo, aplicando mais blefes contra mim do que contra outros jogadores. Vi no histórico de mãos que ele reduzia os blefes contra os outros, mas continuava vindo atrás de mim. Não me incomodou — é poker, e funcionou para ele. Nós não conversamos muito, mas às vezes você simplesmente gosta da energia que alguém traz. Gostei da dele.

Maria: Ter o Adrian Mateos no rail significou que você tinha uma das mentes mais afiadas do poker te apoiando. Vocês dois conversaram sobre a dinâmica com o “The Grinder” ou sobre estratégias específicas contra algum jogador?

Leo: Ele foi ótimo. Me disse que eu poderia mandar mensagem para ele a qualquer hora, dia ou noite, se tivesse dúvidas. Senti-me apoiada por toda a equipe, mas especialmente pelo Adrian Mateos. Nós conversamos mais sobre lidar com a situação em si — estar em uma posição que poderia parecer esmagadora. Ele viu que eu tinha confiança, então seus conselhos serviram mais para validar minha abordagem para o dia.

Maria: É inspirador não apenas pelo quão longe você foi, mas por como você jogou. Você estava sorrindo, se divertindo e não teve medo de se expor — aplicando grandes blefes, fazendo grandes calls. Claro, você pode pensar na mão dos noves, mas isso acontece. Todo mundo já esteve nessa situação.

Leo: Quanto menos você se preocupa em cometer erros, menos perfeccionista você é, mais tolerante com erros você se torna — e, paradoxalmente, menos erros comete.

Maria: Você tem alguma mensagem final de sabedoria? Você já compartilhou tanto, mas tem mais alguma coisa que queira acrescentar?

Leo: Principalmente, quero agradecer mais uma vez. Nunca me senti tão apoiada. Muitas pessoas entraram em contato para saber como eu estava, e pude sentir essa energia. É muito melhor quando é compartilhado. Assim como você não deve levar muito a sério os comentários negativos de pessoas que não conhece, também não deve se deixar levar pelos positivos. Mantenha uma certa distância de ambos.

Algo que lembro a mim mesma nos momentos ruins também se aplica agora: isso também vai passar. Agora posso parecer uma super-heroína e tudo estar ótimo, mas, no fim do dia, sou muito mais do que apenas meus resultados no poker. Não crio minha identidade a partir do jogo, e acho que isso é saudável para qualquer pessoa — seja jogando profissionalmente ou por diversão. As coisas vão dar certo, as coisas vão dar errado, mas você continua sendo você. Seus resultados não devem ser o que valida quem você é.

Maria: Essa é uma mensagem maravilhosa para terminar, e acho que contribuiu para o seu sucesso este ano. Para constar, não vemos você definida pelos seus resultados — mas parabéns por um resultado incrível! Foi um prazer ver você e torcer por você, e estamos muito felizes que tenha participado.

Leo: Também adorei conversar. Espero que estejamos as duas deep no Main Event de Barcelona.